sexta-feira, 18 de setembro de 2015

A cobertura sensacional da economia brasileira

O jornal Valor Econômico desta quinta-feira (17 de setembro) exercitou mais uma vez seus critérios heterodoxos de edição jornalística. A primeira página do jornal traz duas chamadas sobre a questão do petróleo. Uma, “Investidor global vende Petrobras”, uma matéria bastante técnica publicada no caderno de Finanças “explica” que os especuladores internacionais, devido à perda do grau de investimento da empresa, na esteira da avaliação do Brasil pela agência Standard & Poor's, estão vendendo suas ações e que “A saída pode trazer ainda mais volatilidade ao preço do papel”.
A segunda, publicada na sessão de Empresas, é apresentada na primeira página em um pequeno texto com o título “Petroleiras vão continuar sob pressão”, onde o leitor fica sabendo que outra agência de classificação, a Moody's (não aceitamos trocadilhos com seu nome) avisa que “acredita que os preços do petróleo continuarão muito baixos durante o próximo ano, perto de US$ 50, o que vai agravar o perfil já negativo de geração de caixa das grandes petroleiras globais e forçá-las a uma nova rodada de cortes em investimentos”, o que, naturalmente, atingiria a Petrobras.

Se o leitor olhou apenas as manchetes da primeira página ficou com a percepção de que só há notícia ruim para a estatal brasileira de petróleo. Mas se olhar a parte interna do jornal (pág. B3) vai sair com uma percepção bem mais nuançada. Na reportagem “Produção aumenta e puxa ação da Petrobras”, vai ler que Bruno Piagentini, analista da Coinvalores, avalia que “O aumento da produção [da Petrobras] tem um claro efeito positivo”, que Flávio Conde, consultor da WhatsCall, comemora “Finalmente, há algo de positivo, nesse mar de coisas negativas” e vai saber que na opinião do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires, o crescimento da produção é “consistente”.

Mas como a reportagem precisa ouvir todos os lados da questão (regra básica do jornalismo), ela traz a opinião de um “analista de um grande banco de investimento, que preferiu não se identificar”, que pensa que “o relatório de produção da Petrobras deve ser avaliado com cautela” e que “o efeito inverso pode ocorrer nos próximos meses”.

Também é curioso que, na primeira página do mesmo jornal esteja estampada, com destaque de uma grande foto e o título “Sinal verde para rebaixamento” que traz o singelo texto (aqui publicado na íntegra): “MarkMobius, presidente de mercados emergentes da Franklin Templeton, diz olhar com atenção a bolsa brasileira e espera a estabilização do real para avaliar grandes investimentos no país, Página D1”.

Esta chamada de capa passa ao leitor a ideia de uma aparente atitude de neutralidade e passividade em relação ao cenário econômico brasileiro, mas, ao se ler a entrevista, pode-se notar uma posição bem mais assertiva. Perguntado se o Brasil está “menos interessante em termos de investimento depois do rebaixamento” a resposta é categórica; “Não. O Brasil não está menos interessante em termos de investimento”, à segunda pergunta, “O rebaixamento pode criar oportunidades?” a resposta é “Sim”. Nada disto é passado ao leitor da primeira página.

Este quadro alimenta com novos dados minha teoria de que notícia que pode ser considerada positiva para a economia brasileira tem uma chance muito menor de aparecer na capa de um jornal de economia do que a que apresenta aspectos negativos, ou seja, a exemplo do que acontece no noticiário policial, também existe sensacionalismo na reportagem econômica.

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