quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Auditório Vladimir Herzog é trincheira da luta pela democracia

Os jornalistas (da esq. para dir.) Sérgio Gomes; Paulo Markun, Luis Paulo Costa e Anthony de Christo, que estiveram presos junto com Vladimir Herzog no DOI-Codi no dia de seu assassinato, durante ato referente aos 40 anos do assassinato do jornalista no auditório que leva seu nome.
Como é de conhecimento de todo jornalista, em outubro de 2015 completam-se 40 anos do assassinato do jornalista Vladimir Herzog. O que nem todos sabem é que o auditório do Sindicato dos Jornalistas recebeu este nome também há exatos quarenta anos. Após toda a comoção nacional causada pelas falsas explicações oficiais que tentaram transformar um assassinato em suicídio; de o enterro de Vlado ser realizado sob forte tensão e do “convite” recebido pela diretoria do Sindicato para que comparecesse ao II Exército, como um rastilho de pólvora, sem que houvesse qualquer convocação formal, uma verdadeira multidão compareceu à sede do Sindicato e lotou o seu auditório.

Uma escalada de violência se abateu sobre os jornalistas no estado de São Paulo no mês de outubro de 1975. Naquele momento haviam 11 jornalistas detidos no Destacamento de Operações Internas – Centro de Operações de Defesa (DOI-Codi) do II Exército: Anthony de Christo; Diléa Frate; Fred Pessoa; George Duque Estrada; Luis Paulo Costa; José Vidal Pola Galé; Marinilda Marchi; Paulo Markun; Ricardo de Moraes Monteiro; Rodolfo Konder e Sérgio Gomes. Todos presos arbitrariamente, ilegalmente sequestrados em suas casas ou empregos e encarcerados na rua Tutóia, sede do DOI-Codi, onde sofreram torturas físicas e psicológicas.

Vladimir Herzog, o 12° desta lista, sabendo que era procurado pelos agentes da repressão, na manhã do dia 25 de outubro de 1975 se apresentou voluntariamente para prestar depoimento. Foi detido e, no mesmo dia, foi assassinado sob tortura nas dependências do DOI-Codi. Mais dois jornalistas se apresentaram para depor e foram detidos depois da sua morte: Luis Weis e Marco Antonio Rocha que, felizmente, e certamente devido a repercussão negativa da morte do companheiro, foram poupados das torturas.

Este era o pano de fundo sob o qual se desenrolou a “reunião de esclarecimento” comandada por Audálio Dantas naquela noite. O cuidado de não caracterizar oficialmente os encontros que se seguiram ao assassinato de Vlado como sendo “assembleias” partiu da diretoria. Agindo desta maneira, a legalidade do Sindicato estava preservada. Eram outros tempos e o Ministério do Trabalho poderia, a qualquer momento, intervir no Sindicato e afastar a diretoria nomeando um interventor, e isto deveria ser evitado a qualquer custo, principalmente pelo fato de que a retomada do Sindicato pelas forças progressistas havia ocorrido poucos meses antes, com a eleição da chapa encabeçada por Audálio Dantas na eleição de março de 1975.

Aquela se tornou uma assembleia diferente, na qual não se votou e nada foi deliberado oficialmente, mas tudo foi anotado e remetido para a Diretoria Executiva que depois tomou as decisões “sugeridas”. Jornalistas presentes naquela data recordam que os debates foram duros, com posições radicais em choque com outras mais moderadas.

Como foi testemunhado por muitos e descrito por Audálio Dantas e por Fernando Pacheco Jordão em seus livros, uma proposta foi aclamada por unanimidade sem sequer ser remetida para a reunião oficial da diretoria; a de que aquele espaço passaria a se chamar Auditório Vladimir Herzog.

A sede do Sindicato dos Jornalistas havia se instalado na rua Rego Freitas em 1970, quando a entidade foi transferida das imediações da praça da Sé para a vizinhança da Praça da República. No entanto, o seu auditório ainda não havia sido batizado até aquela data. Salvo engano, após aquela “assembleia” não há registro de nenhum ato oficial de criação ou de inauguração do auditório Vladimir Herzog.

Assim, na noite de 27 de outubro de 1975 surgiu o auditório Vladimir Herzog e desde então, este local se tornou uma trincheira da sociedade civil para a defesa dos direitos humanos, da liberdade de imprensa e do Estado Democrático de Direito.
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José Augusto Camargo – secretário-geral da Federação Nacional dos Jornalistas e diretor do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo (artigo publicado no jornal Unidade, nº 379, outubro/novembro de 2015)

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